Tradição ceramista Tupiguarani

Por Ondemar Dias – Arqueólogo

A Tradição arqueológica é identificada quando uma classe de material, como a cerâmica, por exemplo, é produzida por um povo segundo técnicas de confecção que se repetem seja na mistura da pasta, na maneira de dar forma e queimar os objetos, no uso de padrões de decoração similares e em que a própria cerâmica se integra num contexto também repetido que atinge desde escolha dos ambientes para moradia, à produção dos alimentos e aos costumes funerários, sistemas de construção, etc. Ou seja, onde as evidências expressa no acervo material refletem sistemas de vida regidos pela repetição dos atributos culturais, independentemente dos locais e do tempo em que tais povos se deslocam. Os padrões de ancestralidade regem a produção material dos artefatos.

Entre as grandes Tradições culturais brasileiras se destaca aquela que foi originalmente denominada Tupiguarani. Ela é representada pelo acervo recolhido desde os Estados do Sul do nosso país até a região amazônica. E foi desde o início associada aos povos de fala Guarani no Sul do país aos Tupis do Norte, entendendo-se que a divisão entre ambos ocorre na área do Estado de São Paulo.

Com o avanço da pesquisa arqueológica, as contribuições dos antropólogos, dos estudiosos da evolução das línguas antigas, incrementando os dados disponíveis, passou a ser aceito que sua origem é amazônica, de povos antigos, que se fixaram inicialmente na área de Rondônia daí migrando em levas sucessivas para o litoral, onde na altura do Rio Tietê se dividiram em dois rumos, constituindo a Tradição Guarani ao Sul e a Tradição Tupi ao Norte. Constituindo as principais tribos indígenas que os europeus encontraram se deslocando no litoral na época dos descobrimentos. 

Caracteriza estes povos, além das duas vertentes da mesma língua, a cerâmica que é produzida com formas assemelhadas; uma decoração variada, seja ela aplicada sobre superfícies alisadas e que recebendo um banho de argila fina ficam preparadas para decorações pintadas em motivos geométricos nas cores vermelha, preta e algumas vezes branca. Mas também podem receber decorações plásticas, em forma de linhas incisas, pequenos volumes de massa (o “corrugado”), de ponteados com objetos variados, aplicação de unhas, etc.

Complementa os padrões da tradição a eleição dos locais dos sítios, sempre em áreas favoráveis à produção do milho no Sul e da mandioca no Norte e, sobretudo os seus rituais de sepultamento em grandes urnas decoradas ou não, acompanhadas de oferendas diversas.

Deve ser destacado o fato de que as tribos produtoras desta cerâmica, fossem tupis, fossem guaranis, se deslocavam no espaço em ondas sucessivas, invadindo e sempre combatendo os povos locais, fossem eles da mesma Tradição ou não. No caso de Macaé, território há séculos habitados pelos povos caçadores coletores sambaquianos e por tribos pertencentes a outros grupos culturais e genéticos como os Goitacás e os Guarulhos, a conquista do local pelos Tupis foi muito dificultada pela resistência destas comunidades. Conclusão apoiada tanto na documentação histórica que afirma esta resistência, assim como também aquela mantida por estes povos contra a penetração europeia, quanto também pelo fato de que no cômputo geral dos sítios, os vinculados à Tradição Tupi são muito mais raros do que os sambaquis. E é na Ilha de Santana, Macaé (RJ), que foi localizado o ultimo e mais recente sambaqui, como bastião de resistência destes povos do litoral brasileiro.        

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